Imagem: Masumi Hayashi
Vasco Gato. A Fábrica. (Língua Morta, 2013)
FLUVIOGRAFIA
Não se trata de viagem
com itinerário.
A espuma decifrada oculta ainda
um leito que jamais
renunciará
ao seu insuspeito modo de amar:
sugar lentamente
os dedos incautos
com que atestamos a frieza das águas.
Tudo o que esperámos
terminou cilindrado
sob o sigiloso motim
das horas reais,
e só assim se pôde encarar a paisagem
em que de facto estávamos
e de facto fingíamos.
As viagens só são belas
para quem não as faz.
Nós, munidos de trapos e
especiosas madeiras,
estremunhados de todos os dias,
mergulhámos no tenebroso e desidêntico
vocábulo da vida: isto.
FLUVIOGRAFIA
No se trata del viaje
como itinerario.
La espuma descifrada oculta todavía
un lecho que jamás
renunciará
a su insospechado modo de amar:
sorber lentamente
los dedos incautos
con que colmamos la frialdad de las aguas.
Todo lo que esperamos
terminó apisonado
bajo el sigiloso motín
de las horas reales,
y sólo así se puede encarar el paisaje
en que de hecho estábamos
y de hecho fingíamos.
Los viajes solo son bellos
para quien no los hace.
Nosotros, abastecidos de trapos y
fuleras maderas,
aturdidos por todos los días,
nos sumergimos en el tenebroso e inidéntico
vocablo de la vida: esto.
FLUVIOGRAFIA
Non se trata da viaxe
coma itinerario.
A escuma descifrada oculta aínda
un leito que xamais
renunciará
ao seu insospeitado modo de amar:
zugar lentamente
os dedos incautos
con que ateigamos a frialdade das augas.
Todo o que agardamos
terminou cilindrado
baixo o sixiloso motín
das horas reais,
e só así se pode encarar a paisaxe
en que de feito estabamos
e de feito finxiamos.
As viaxes só son belas
para quen non as fai.
Nós, abastecidos de trapos e
especiosas madeiras,
atordados por todos os días,
mergullamos no tebroso e inidéntico
vocábulo da vida: isto.